O Dia

Um dia, os meus lábios mover-se-ão para te fazer ouvir os ecos desta música que há anos ressoa no meu coração. Será um suspiro que irá calar os sons que nos envolvem e distraem; será uma certeza tão forte que poderá suster o mundo inteiro no segundo em que se revelar, tudo parando, tudo interrompendo, esperando o momento em que o brilho há tanto tempo em mim escondido se mostre estampado nos teus olhos, procurando os meus.

Um dia, verei o tremer do fino recorte dos teus lábios que me encanta a tentar moldar as palavras que o coração deseja gritar, verei as lágrimas escoarem as palavras dos teus sentimentos, ver-te-ei levar a mão à testa tentando segurar uma réstia de racionalidade nesta fragata de loucura em que te quero embarcar.

No dia em que as palavras deixem de ser apenas tinta e se tornem anéis de fogo que marquem os corações que se atravessarem no seu caminho para o teu... nesse dia, estarás lá para me ouvir?

Quando?

De quem vi comigo, de quem vi contigo, não conheço outro destino que não nos junte. A saudade não chega para quanto me fazes falta.

O Outro Lado do Espelho

Parto preso pelos cordões do tempo. Troquei os sons pelo doce sorriso do silêncio e aí me deixei, vazio de expressão, contemplando um futuro que não era meu, em que não era eu. Diluí a alma num lago de calmas provações e me fixei no espelho de água de uma imagem minha distorcida. Finalmente, ouvi o sussurro das velhas da praia, arautos de experiência desiludidos, clamando para si o meu nome e gravando na pedra do Destino as feições do meu coração...
Parti a prisão dos cordões do tempo, cindi a pedra que me pesava o corpo e libertei o bater da minha voz, escrivão do meu sentimento, estilhaçando esse lado do espelho que não é senão ilusão. Em mil reflexos se dividiu, em mil gotas se evaporou. Nada mais é.
Sigo livre das linhas que não escrevi, sorrindo em silêncio, em busca do espelho que um dia reflicta nada mais do que a imagem de ti. Comigo.

Sempre perto

Em tempos, pedra. Hoje, vidro. Gentil e suave vidro. Sinto o toque frio na fonte dos meus sentidos e lembro a areia que correu na praia de alguém, a decidida brisa que a moveu, que a acompanhou para um destino maior. Fixo o olhar na crua beleza das curvas que moldaste por mim e inundas o meu corpo com o salgado ondular do teu corpo. Sabes a força do mar, conheces os segredos do vento...

Haverá algo mais belo que uma praia num dia de Inverno? Sentar num rochedo à beira de uma falésia. A fúria das sereias a bater nos empedernidos corações da tristeza que os criou quando o tempo não era mais que uma memória. Haverá algo mais belo que admirar a efémera glória da espuma que vence a onda para fenecer no instante seguinte no alto da sua liberdade? Não são assim as nossas vidas?...

Assim foi a minha vida contigo. O rude e o suave em permanente contacto de beijos de fúria e emoção, fortes, doces, ofegantes e duradouros. Tentámos voar tão alto nesta onda que perdemos o pé. De tão intensa, tornou-se lesta a escapar-se entre as malhas desta rede que nos prendeu e juntou como se outro destino não acreditasse poder sobreviver a este acordo de contradições e impossibilidades. Efémero foi. Fiquei na onda que banha a rocha que és. E assim estarei sempre perto
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O Teu Lado Da Cama

Sonho contigo todas as noites que os deuses me permitem acordar com um sorriso nos lábios. Permanecem na vaga memória os traços dos teus olhos intensos e o aroma que sinto engana-me ao ponto de te procurar deitada a meu lado. Vão é o caminho que trilho pelos lençóis com as pontas dos meus dedos em busca do calor que não esqueceram... Cruel, sim, é o Sol que se faz presente no instante seguinte e me recorda que é ali, perto dele, que tu estás, onde o teu calor se perde para outros dedos e o leve soar do teu suspiro se dissipa longe dos meus ouvidos... Sinto diluirem-se as linhas do teu corpo e a tua figura já não marca o teu lado da cama... Escondo a cara em minhas mãos à lembrança que me amarra e afasto o olhar deste brilho que me envolve... Afinal, a vida não sonha como a gente.
Acordo contigo todos os dias e aceito o melhor que a vida me pode dar. Guardo ainda alguma esperança que ela um dia se engane, me encontre e me dê quem de melhor alguma vez me deu. E espero.

Ainda / Still

Dou comigo a sorrir de quando em quando, com o olhar fixado num ponto do passado, oblívio do que sucede à minha volta. Dou comigo envolto num sentimento quente que me pede premente para nunca cessar, para nunca mais voltar, para não ter de ir... Dou comigo a viver os momentos que puseram um brilho nos nossos olhos, um brilho que não posso alguma vez tentar definir ou explicar de tão nosso que o sentimos... aquele brilho... que conseguimos ver e sentir nos momentos em que a escuridão da noite não foi senão uma patética e inócua tentativa de impedir a partilha das nossas vidas. Acordados para a vida, demos e vivemos sem pensar no dia de amanhã; fomos simples e verdadeiros e rimo-nos das leis do mundo. O que temos é bem mais forte; o que temos não tem de obedecer. Amorosamente é e nada mais precisa.
E o sorriso que por vezes dá comigo fixado num brilho do passado, encontra-me agora e ainda inundado pela escuridão de não me partilhar contigo.

Every once in a while, I find myself smiling while staring at a moment in the past, oblivious of what happens around me. I find myself embraced by a warm feeling that asks me desperately to never cease, so it never has to return, so it may never be forced to go... I find myself living the moments that made our eyes shine, a glow I can never intend to describe or explain as it was so ours... that glow... that we were able to see and feel when the darkness of the night was not but a pathetic and inocuous attempt to stop us from sharing our lives. Finally aware of life, we gave ourselves and lived each other without looking at tomorrow; we were simple and true and we laughed at the rules of the world. What we have is stronger; what we have does not have to obey. Out of love, it is and nothing else requires.
And the smile that every once in a while finds me staring at a moment in the past, meets me now and still overwhelmed by the darkness of not sharing myself with you.

Bom

O sono abre-me a mente. Como se o bocejar do meu corpo quebrasse o cadeado dos pensamentos e começassem a girar as rodas deste moinho de sentimentos que vai remoendo por dentro. E por mais voltas que as velas do meu sentir dêem, tu permaneces o centro da minha atenção, da minha obsessão, da minha paixão. Não, de facto, o mundo não revolve à tua volta mas o meu não tem outro desejo. És, porventura, quem de mais impressionante encontrei na minha vida e eu quero fazer parte da tua enquanto a minha durar. Quero fazer-te sentir a alegria de me reveres, a felicidade de me sentires num abraço recheado de beijos sentidos e desejados. Quero tocar a tua vida como a abelha toca a flor, gentilmente, com a carícia de quem se dá e depende do outro. Quero transportar o teu olhar para toda a minha gente ver e entender que o amor que te tenho é de tal ordem que aceito o que me quiseres dar. Não me diminui, não me reduz, não me rebaixa nem me inferioriza. O pouco a quem pouco basta é mais que o muito a quem tudo não chega. E é bom.

Ausência

Sentado no escuro, procuro ainda o conforto que um dia senti tão forte e tão quente no teu regaço. Faz tanto tempo que não adormeço sem pensar na promessa que te fiz e na forma como te desiludi. Sinto tanto o tempo que tivemos e a alegria que te impedi de ter que este escuro chega a pesar mais que a pedra que atei ao meu coração e que deixei cair no rio das nossas vidas. Julgo mesmo que a atei um pouco ao teu... e nenhuma lágrima poderá alguma vez repor o bem que não te fiz.
Deitado no escuro, procuro a resposta de um anjo, daquele petiz incarnado na pele da tua vida. Procuro um sinal que me devolva as palavras deste meu gesto que te abraça e que te quer ter perto.
Quero beijar o teu corpo... passar levemente os dedos pelo teu cabelo... sentir o desenho da tua face com a ponta do meu nariz enquanto oiço um suave suspiro por entre o teu sorriso...
Meu Deus, como sinto a tua falta!

Quotidiano / Everyday

Todos os dias, as ondas molham os meus pés. Todos os dias, o toque da espuma corre suave por entre os meus dedos. Todos os dias, o mar escreve na areia o doce murmúrio do teu nome. Todos os dias, o vento que suspiras na minha vida sopra na tua direcção. Todos os dias, as nuvens desenham com candura uma forma do teu corpo outrora desconhecida. Todos os dias, ouço o teu sorriso desvendar-me os teus desejos. Todos os dias, encontro nos olhos de alguém a tristeza de não saber sentir o que todos os dias sinto contigo. Todos os dias, cruzo-me com almas que correm à procura de ti. Todos os dias, o Sol grava na minha pele o teu calor. Todos os dias, o sonho nos junta sem demais temor.

Não há um dia em que não chore com os teus lábios nos meus.

Everyday the waves flow through my feet. Everyday I feel the foam running smoothly in between my toes. Everyday the sea writes the sweet whispering of your name in the sand. Everyday the wind you blow into my life sighs for you. Everyday the clouds kindly shape a drawing of your figure I once knew. Everyday I listen to your smile revealing your desires. Everyday I find in someone's eyes the sadness of not feeling what I feel everyday with you. Everyday I cross the path of souls who run looking for you. Everyday the sun engraves your warmth in my skin. Everyday a dream joins us with no further fears.

Not one day goes by that I do not cry with your lips against mine.