Lobo

Surges a vermelho. Trazes silêncio a onde passas. Intimidas quem te segue. Os teus lábios têm o talento único de nunca terem dito a palavra que os teus olhos incessantemente repetem a quem se atreve questionar. O teu silêncio é de seda. Toca, marca e segue caminho. O rio no teu cabelo flui em todas as direcções em enxurradas de aparente prazer liberto, deixando-te um sorriso no rosto. O controlo do teu descontrolo desconcerta-me. É um desafio, percebo, daqueles que não quer resposta nem solução. Apenas desafio, uma prova que se faz sem se deixar a marca do batom na borda do copo, esperando que um incauto debite todas as qualidades daquilo que nunca realmente provou. Ninguém o fez. Mas o lobo traiu-me. O seu pelo é suave e a sua hora perfura qualquer armadura. Louca, a mão que ousou cruzar-se com a tua. Uma carícia que nunca mais se esqueceu. Um sorriso roubado que se deu sem se ver, sem mais ninguém ver... um cabelo que se prendeu no canto da boca... agora ficas longe, demasiado longe para a poder sentir, para o poder ver, para o poder repor, de novo. Se, ao menos, a cova desse sorriso não me matasse...